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ANJO DALTÔNICO, O (2005)
Créditos
Curta-metragem, Sonoro, Experimental
Material original: 35mm, cor, 20', 560m

Origem: Salvador (BA)
Produção:2004
Estréia: 25/11/2005, Salvador (Multiplex Iguatemi)
Locações: Itiúba


Direção: Fábio Rocha
Assistente de direção: Maria Carolina Silva
Continuidade: Taisse Andrade

Companhia(s) produtora(s): Araçá Azul Cine e Vídeo, Dobra Filmes
Companhia produtora associada: Pandora
Produção executiva: Fábio Rocha, Solange Lima
Direção de produção: Solange Lima, Marcelo Torres
Platô: Paulo Thiago , Mateus Damasceno
Produção de set : Amanda Aciolli
Produção de base : Sheila Gomes
Produção de elenco: Bertho Filho

Roteiro: Fábio Rocha

Direção de fotografia : Antônio Luiz Mendes
Assistente de câmera: Evandro Fraga, Haroldo Borges
Chefe de elétrica : Luís Carlos Campos
Assistente de elétrica: Helder Brito
Maquinária: Nadson Fernandes
Assistente de maquinária: Helder Brito
Fotografia de cena: João Ramos
Making Of: Luciano Lé

Direção de som: Fábio Marc
Som direto : Fábio Marc
Assistente de som direto : Kleber Morais

Direção de arte : Henrique Dantas
Figurinos: Diana Moreira
Assistente de arte: Adélia de Carlos, Vânia Dias
Produção de objetos : Fabíola Aquino
Maquiagem : André Luiz Oliveira
Design gráfico : João Ramos

Montagem : Marcos (Kiko) Povoas, Bau Carvalho

Trilha sonora: Jorge Solovera

Elenco: Inaldo Santana (Toinho de Faustina, velho)
Rafael de Souza (Toinho de Faustina, criança)
Agnaldo Lopes (Toinho de Faustina, adulto)
Fernando Neves (Torquato)
João Rabelo (Quirino)
Cristiane Pinho (Simone)
Bira Freitas (Piroca do Lino) - participação especial
Romário Machado (Zuca de Maneca) - participação especial


Fontes: Transcrição de letreiros (DVD da cópia 1 de "O anjo daltônico"); Fábio Rocha.


Imagens
OBSERVAÇÃO

Observações: Suporte de captação: HDTV.
A “Novíssima Onda Baiana” inclui Fabio Rocha na montagem, Marcelo Torres na direção de produção, além de indicar Maria Carolina e Márcia Faria como diretoras assistentes.

SINOPSE

Sinopse: “Na ânsia de entender seu espírito, Toinho, um velho vaqueiro, vai em busca de suas lembranças da infância. Atravessa contos populares, as fábulas do sertão, o cotidiano pastoril, os costumes e hábitos, levando-nos a repensar o espaço-tempo nordestino. Traça um mapa de suas lembranças, para num segundo momento deixar para trás o passado, em busca de um outro mundo possível...” (Novíssima Onda Baiana/ ABCV)
IMPRENSA

Imprensa: Cláudio Marques: Coisa de Cinema (26/10/2005)

O sertão de cada um

O Anjo Daltônico, curta de Fábio Rocha, aborda tempo e memória, em montagem que incorpora fluxo não-linear.

“O sertão está em mim”, diz um dos personagens de O Anjo Daltônico. Ali, nesse espaço interior que abriga os embates humanos mais antigos, reside o palco do curta de Fábio Rocha. Nesse sertão, o tempo é uno, indivisível, coabitam menino, adulto e velho. Um espreita o outro, observa e relembra como se portou e mesmo se portará diante de determinados momentos e obstáculos.

A memória pesa, é áspera, e machuca como os galhos secos que abundam o sertão.

A câmara se movimenta, persegue seu personagem (o tempo), entre espinhos. Chega-se a sentir a imagem sendo arranhada!

O Velho (Inaldo) simboliza o insustentável fardo das lembranças. Ele mal consegue andar. Seu rosto se transforma, deforma, pela angustia que é o viver, carregado pela memória. A atmosfera de opressão é insondável.

As passagens temporais menino-adulto-velho revelam elos poéticos que explicam mais que qualquer palavra. Não há aqui historinha a ser narrada, o fluxo temporal possui outra ordem e a inteligência passa a ser cutucada. A música, dissonante, em princípio, reitera a estranheza: o que é isso? O que está acontecendo?

O Anjo Daltônico se inicia, em toda a sua potência e poética, sob o silêncio das palavras.

Mas, há uma quebra que se dá justamente quando o verbo entra em cena. Surge de forma arrogante, querendo ganhar espaço a todo custo. Registra-se pela força, não pelo direito de simplesmente ser. Os atores empostam-se, discursam frases de efeito tipo “quem não mente nunca experimentou a verdade”.

Até mesmo a música, antes suplementar, passa a adiantar ou ecoar o que a imagem deveria dizer por si só.

O palco de tragédias temporais transforma-se num arrazoado um tanto quanto esquemático: o proprietário é mau, o homem simples é bom e o povo encontra-se nas virtudes básicas, festeja quando um dos seus não cai na tentação bíblica “Não enganarás o próximo”.

Mas, se ele de fato foi forte (encarou o guarda) qual o motivo daquele sofrimento todo do Velho? Ele venceu o teste, não? O Anjo Daltônico revela-se menos uma obra aberta do que sugeria em princípio e aponta para uma direção moral.

Fica, por fim, a dúvida, se a cópia que foi exibida ainda não é a definitiva, pelo esmaecido das imagens e pela baixa qualidade do som. Pode ser que a sala não estivesse com os equipamentos bem regulados, não se sabe.

Caso a falta de vida das cores e luz seja intencional, opção em si muito interessante, porque desconstrói imagem dita “poética” do sertão, por demais usada, acredito que o melhor seria conferir textura diferenciada, que não se confundisse com dificuldade técnica, algo como baixa qualidade na captação ou transfer problemático.

Um curta desigual, sem dúvida, que alterna momentos intensos (os primeiros minutos, sobretudo) e outros simplistas. Um desequilíbrio que não tira o frescor de O Anjo Daltônico, no final das contas, que nos instiga a discutir abertamente o fazer cinema.


* * *


Fábio Rocha: Novíssima Onda Baiana (2005)

Coisas do Diretor – Um Sertão Transversal


O anjo daltônico, de Fábio Rocha, é um filme que trata da invenção do sertão pelos “olhos trocados” da memória, levando-nos a repensar os hábitos e o espaço-tempo “sertânico”. Numa curta cartografia da memória ele faz roçar a memória individual na memória coletiva desses “territórios”. O memorioso corta no fio de uma navalha a idéia de tradição e identidade, aliando e imbricando o regional do terreno com a amplitude do universal. Pela natureza molecular e secreta dos devires que constituem esse sertão feito “fora íntimo do pensamento”, o filme acaba por jogar com uma “montagem planonêmica”, onde um plano é co-extensivo à outro, num jogo de interiores e exteriores anexando às dobras do corpo às dobras da terra. O canto entoado pelos vaqueiros para tocar a “manada cromático-discursiva” atravessa o Brasil inteiro com sua expressão nômade que somos tentados a ouvir: “ê ô!”, “errô!”.

O filme de Fábio Rocha antes de ser uma metáfora, torna-se um avatar dos delírios maquínicos de um ser-tão imperceptível. Um olhar passa pela janela, corta uma árvore e apreende a lenta queda do boi puxado pelo rabo, momento em que a existência do vaqueiro não pode ser conflito existencial do sujeito de verdade. Não há nada para interpretar.

A velhice e a infância não estão numa relação da memória-clichê (flashes), ao contrário, as linhas de fuga por eles conectada os à máquina abstrata do esquecimento. Vamos da desnordestização à renordestização no fluxo de formações imagético-discursivas, multiplicando as habitações de Pirocado Lino (Inaldo Santana e Rafael de Souza). Essa teia “planonêmica” concerne a forma de expressão, “o planômeno”, “o plano de imanência” conectado a uma “máquina abstrata” que produz “linhas de fuga sertânicas”, fazendo do local o absoluto.

Desejamos mesmo que esse filme possa não só montar uma pequena cartografia nômade, (transformando o cenário, as cores e os personagens sem sair do lugar) e anti-nordestina, como revelar um grande movimento de olhar atravessado, na transversal (daltônico), para os estereótipos que emergiram com a idéia da nordestinidade.

Alcançaremos o seu limiar, na medida em que ele possa furar como broca a espessura dos “cinemas latino-americanos de superfície, em festivais e eventos outros, empurrarando essa produção para fora dos padrões impostos por uma idéia caquética de “cine-entretenimento”. Já será um grande passo mostrar como os curtas-metragens podem não só divertir, mas sobretudo, desalienar os desejos e a (re)construuir uma sensibilidade artística que acelere a derrocada das subjetividades dominantes. Se freqüentemente dissermos e mostrarmos como o curta pode contrariar esses investimentos recalcados de longa duração, nossa cinematografia será não só numerosa, mas muito mais poderosa.

Mais informações
Prêmios: Roteiro premiado pelo projeto Braskem Cultura e Arte - Categoria Cinema (2004)
Cópias disponíveis: Acervo do diretor: 35mm e DVD
Links: Novíssima Onda Baiana http://www.abcvbahia.com.br/novaonda/15
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Contato: Fábio Rocha: dobrafilme@gmail.com