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REDENÇÃO (1959)
Créditos
Longa-metragem, Sonoro, Ficção
Material original: 35mm, b&p, 56', 24q, Igluscope

Origem: Salvador (BA)
Produção:1957
Estréia: Salvador (Cine Guarany)


Direção: Roberto Pires
Continuidade: Élio Moreno Lima

Companhia(s) produtora(s): Iglu Filmes Ltda
Produção: Élio Moreno Lima
Assistência de produção: Alberto Barreto

Argumento: Roberto Pires
Roteiro: Roberto Pires

Direção de fotografia : Hélio Silva
Câmera: Oscar Santana
Assistente de câmera: Alberto Barreto
Chefe de elétrica : Mario Magalhães
Iluminação: Rodi Lucheri

Montagem : Mario Del Rio
Assistente de montagem : Raimundo Higino

Orquestração : Alexandre Gnatalli

Elenco: Geraldo del Rey (Newton)
Braga Neto (Raul)
Maria Caldas (Magnólia)
Fred Jr. (Homem X)
Milton Gaúcho (Comissário de polícia)
Alberto Barreto
Normand F.Moura
Jackson O. Lemos
Raimundo Andrade
José de Matos
Costa Jr.
Rodi Luchesi
Jorge Cravo
Orlando Rego
Oscar Santana
Leonor de Barros
Élio Moreno Lima
Waldemar Brito
Roberto Pires
Kiaus Kiaus
Jorge Ernesto

Fontes: Transcrição de Letreiros (DVD Versão restaurada); Cinemateca Brasileira; acervo da Família Roberto Pires; Setaro (1976).
OBSERVAÇÃO

Observações: Primeiro filme de longa-metragem produzido na Bahia, marca a estréia de Roberto Pires (1934-2001) na direção. Para realizar esse filme ele croiu a lente “Iglu-scope”.

Restaurado em 2010 com recursos do Fundo de Cultura do Estado da Bahia.

“CENS/I indica a metragem de 2.000m (73 min para um provável cópia em 35mm), mas AV/ICB indica a duração de 59min e o material examinado 56min.” (Cinemateca Brasileira).

Silva Neto (2002) e Viany (1959) indicam RC Pires e Oscar Santana como autores do argumento e do roteiro, bem como Oscar Santana como cinegrafista. Viany inclui ainda Eloíse Cardoso no elenco. Matéria de Hamilton Correia no Diário de Notícias (8/3/1959) indica Oscar Santana como “coordenador” e “cinegrafista”. Nome do diretor Roberto Pires grafado nos créditos como “RC Pires”.

Confira também o filme “O Artesão dos Sonhos” (2008) de Paulo Hermida e Petrus Pires.


SINOPSE

Sinopse: "Um psicopata estuprador é contido por dois jovens fazendeiros, um dos quais está envolvido com a polícia e que, ao proteger uma jovem ameaçada, encontra a ''redenção''.” (Silva Neto, 2002)
IMPRENSA

Imprensa: Walter da Silveira: Diário de Notícias (15/3/1959)

Redenção: Passado e futuro do cinema na Bahia (II)

Álvaro Moreyra disse, certa ocasião, não compreender por que, entre o profissional e o amador, se exaltava aquele e se desprezava este. Para o grande cronista, se o profissional age por interesse da carreira que escolheu, o amador não vê mais que a arte de sua paixão. Amador – o que ama. Não só etimologicamente. Semanticamente também...

Dentro deste conceito, Redenção é uma obra de amador. Não importa que três profissionais – os autores da fotografia, da música e da coordenação: Hélio Silva, Alexandre Gnatalli e Mário del Rio – houvessem participado da elaboração. Essa participação não destrói o espírito e o sentido do filme. Nem sua espontaneidade. Porque a participação maior, aquela que mais diretamente identifica esta fita como qualquer outra, isto é, a do argumentista e do realizador, decorre de um puro amadorismo. O estilo da narrativa, como da mise-en-scène, depois também o da interpretação, é um estilo de amador. Até quando as ciladas do virtuosismo profissional seduziram e enganaram o roteirista e diretor: particularmente, na seqüência onírica da acusação do jovem criminoso (Braga Neto), com imagens e vozes que lembram a de muitos filmes americanos e europeus, avançando e recusando máscaras dos personagens num fantástico ingênuo. É num momento assim, decerto pela errônea preocupação de se libertar do amadorismo, que este mais se caracteriza, porém, já aí, no pior significado da palavra. Entretanto, em muitos outros momentos, a simplicidade da construção, para não dizer a aparente pobreza da construção dramática, empresta ao filme uma autenticidade, uma comunicação de vida, que se diria resultado de uma longa experiência: um exemplo se encontra em toda a cena do jogo de cartas, na casa visitada pelos dois personagens centrais. E para quem saiba o que é a arte cinematográfica, como, aliás, o que é qualquer arte, não há o desconhecimento de que o mais difícil é esconder ao espectador o processo usado para exprimir uma ação, isto é, para lhe dar a impressão de que o fato não foi recriado, mas está acontecendo.

Em Redenção a possibilidade de vida começa com o argumento. Esse argumento serve a uma estória falsa, uma estória escassa, sem densidade real. Dir-se-ia tão episódica que não conduziria a um longa-metragem, nem fascinaria o público. Por que, então a possibilidade de vida? Há, em um cinema, um elemento técnico que se transforma em estético e, posteriormente, em vital, uma força que domina o espectador, através de uma linguagem própria e específica. Esse elemento é a continuidade. Sem ela, nenhum filme exerceria aquele aprisionamento, aquela absorção do espectador estudada pelos filmólogos. E é ela que, em Redenção, transforma uma estória falsa, escassa, sem densidade, num roteiro fílmico, se não convincente, ao menos capaz de nos prender à sua narrativa. Acaso teria Roberto Pires consciência de que a continuidade do seu filme era das melhores do cinema brasileiro, ele que não quisera, não pudera ou não soubera imaginar um relato menos irreal e sem conteúdo? Não se afirme que a continuidade, a correlação dos planos, das cenas e das seqüências de Redenção dependeu mais do velho e arguto montador Mário del Rio – responsável já por algumas felizes coordenações do cinema brasileiro – do que do jovem baiano. O montador tem a matéria fílmica que o realizador lhe dá. E este, quase sempre, filma com o que está no roteiro. Num caso como Redenção, aliás, não só o montador só dispõe de uma restrita matéria fílmica, desde que a equipe não contou com muita película virgem para gastar, como o próprio realizador, em vista do amadorismo da produção, usou de uma extrema liberdade de movimentos na filmagem em relação ao argumento. Deste modo, se, de uma parte, Roberto Pires revela uma vocação de roteirista, um dotado de uma visão cinematográfica de vida e de mundo, de outra parte é de se exigir dele que, num filme futuro, nos transmita uma narração mais autêntica, quer do humano em si, quer do humano representativo da Bahia.

Até porque, afora o fato de ser Redenção um filme com capitais baianos, escrito e dirigido por um baiano, interpretado pro baianos, a presença da Bahia é uma simples presença de paisagem. E, num certo momento, desfigurada geograficamente, quando, rodando, a caminhonete para o centro da cidade, vinda da avenida que antecede Itapoã, aos nossos olhos aparece, de súbito, o panorama de Itapagipe visto da Ladeira de São Caetano... O gosto de fotografar o belo paisagístico não deveria ter levado a essa incoerência topográfica. Ademais, se limitando o filme a um conto policial, sem relacionamento qualquer com a Bahia, não havia necessidade de insistir tanto na apresentação de ruas que não viriam a funcionar como ambiência do drama. Parece que interferir, aí, um truque profissional impossível de ser atribuído a Roberto Pires. Deve ter partido de Hélio Silva, o diretor de fotografia, como uma fórmula de aumentar o tempo cinematográfico, em vista da escassez de tempo real do filme.

Hélio Silva deveria, porém, preocupar-se mais com a pequena quantidade de película à sua disposição, a fim de reservá-la para momentos em que a desigualdade de iluminação, sendo flagrante, o obrigaria a repetir a filmagem. Evitaria, assim, cenas que, no decurso fílmico, acontecem à mesma hora, na praia e na avenida à beira do mar, que deveriam, portanto, ter o mesmo grau de iluminação, mas não têm, sucedendo uma queda ou um ascenso de luz injustificável. Esse desnível técnico não ocorre em interiores, nos quais o controle foi mais exercido, mas poderia ser atenuado por um melhor trabalho de laboratório, senão de todo eliminado. Nenhum laboratório, contudo, reduziria o principal defeito de fotografia de Redenção do qual também culpa não possui Hélio Silva: aquele que produziu, nas extremidades de cada plano, a lente inventada pelo jovem Roberto Pires para imitar o cinemascope, ainda aqui partindo menos de um anseio de técnica em ótica do que do sonho amadorista de atingir o mais difícil.

Essa inocência artesanal de Roberto Pires transparece igualmente na mise-en-scène. Se, às vezes, é um diretor que sabe movimentar a ação e compor um enquadramento – a breve investigação do crime na praia o testemunha, com um ritmo de câmera hábil e preciso -, em outros instantes, quando pretende o sensacional e o insólito, jamais ultrapassa de um artifício ingênuo. O idílio diante do mar, a luta de Braga Neto e Geraldo d’El Rey em face do suposto abismo, a reconstituição da morte do criminoso louco documentam que Roberto Pires supôs a necessidade de surpreender e de espantar o público. Mas, em todos esses três momentos, cometeu erros graves. A cena do idílio era supérflua, tão supérflua que constitui um hiato na narrativa do filme: a ação pára a fim de ser interposta a cena. A luta, embora bem vivida pelos dois atores, fica no limiar do ridículo, não cria o suspense e pode determinar um imprevisto cômico, porque todos percebem que nem de mentira há um abismo atraindo os personagens. Na reconstituição da morte do louco, o pinto de vista sendo o do evocador do fato, e este se achando fora de casa, vendo o criminoso a estrangular a jovem, a câmera jamais poderia ir continuar a visão do fato dentro de casa, pois o olho que continuava olhando o episódio não deixara de ser o do evocador, atirando pela janela. O desejo de superar a simplicidade arrastou Roberto Pires para esses equívocos. E eles são tão mais imperdoáveis porque neste filme, onde os defeitos se alternam com as qualidades, há pelo menos uma que o consagra ao contrário da maioria dos filmes nacionais. Redenção só existe e vale como cinema, não é uma obra subalterna de qualquer origem extracinematográfica

Essa dignidade de ser cinema se encontra até mesmo na interpretação e nos diálogos, chaves de todos os fracassos brasileiros. Não se está dizendo que os atores são cinematográficamente formidáveis e que os diálogos são também cinematograficamente acima de reprovação. Diz-se que os atores, por mais primitivos ou incertos, não são mais do que atores de cinema. E dois deles, Braga Neto e Geraldo d’EL Rey, possuem aquela fotogenia que, há cerca de quarenta anos, Louis Delluc identificou como indispensável ao autêntico interprete de filmes. E também se diz que os diálogos, em filme nacional, parecem mais correntios e bem gravador, permitindo uma audição plena das palavras.

Se Roberto Pires e seus companheiros de Redenção tiverem a humildade de não considerar como definitivo o seu êxito, se compreenderem que cometeram tantos equívocos quanto acertos, terão aberto caminho para a produção de longas-metragens na Bahia.

E vão, felizmente, achar competidores. Porque, afinal, a Bahia, talvez a mais cinematográfica de todas as cidades brasileiras, começa a ser vista por sua juventude e sua mocidade em termos de filme, como já era vista antes em termos de romance, de conto, de poesia, de pintura, de música. Dois jovens de grande talento vêm acabar seus primeiros curtas-metragens, ensaios para obras maiores, no campo da ficção ou da realidade. Pátio, de Glauber Rocha é um filme experimental, uma procura de plástica e de ritmo. Rampa do Mercado, de Luiz Paulino, é um documentário, transcrição em imagens, quase folclóricas, de uma das ambiências mais típicas da cidade. Se, por temperamento, podemos estimar o último ainda mais que o primeiro, em ambos temos que reconhecer o fogo inicial de todas as vocações legítimas. E será do encontro dos estilos de um e de outro que deverá, certamente, nascer o filme para o qual estão dando as suas melhores esperanças: Barravento – um elogio da terra e do homem que aqui existem, em seu contato criador e revelador com o mar.

Se pequeno e obscuro teria sido o passado do cinema na Bahia, o futuro poderá ser igual, talvez, à grandeza com que estão sonhando os seus jovens e promissores cineastas.

Fonte: SILVEIRA, Walter: Walter da Silveira. O eterno e o efêmero. Org. e notas:
José Umberto Dias. Vol. 2. Salvador: Oiti 2006, p.76-78.


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Hamilton Correia: Diário de Notícias (5/3/1958 [sic!])

Redenção: marco inicial do cinema baiano

Surpreendeu aos críticos como filme de estreantes – A equipe técnica e o elenco - Planos da Produtora – Devemos apoiar os jovens cineastas.

Reportagem de Hamilton CORREIA

A partir de amanha, simultaneamente nos cinemas Guarani e Tupi, será exibido “Redenção”, o primeiro filme bahiano de ficção, o qual está sendo aguardado com desusado interesse pelos fãs de cinema. A opinião do público será decisiva para o prosseguimento da obra que um grupo de jovens idealistas desta Capital estão tentando levar avante seu ideal de fazer cinema na Bahia.

Já exibido para a crítica especializada e em “avant-première”, na última sexta-feira, “Redenção” não decepcionou àqueles que tiveram a oportunidade de assistí-lo. Pelo contrário, ultrapassou às mais otimistas expectativas, tendo recebido, inclusive, palavras de elogios da maioria dos cronistas presentes.

Se for levado em consideração as condições adversas em que realizaram a película, seus responsáveis revelaram conhecimentos da complexa sétima-arte que raramente se encontram em estreantes. Entretanto, o que mais admiramos na equipe da Iglu Filmes é a força de vontade e a persistência demonstrada desde os primeiros passos há cinco anos passados. De lá para cá, sofreram toda sorte de decepções e encontraram mil e um obstáculos. Mas, nada demovia-os do ideal comum de mostrar ao Brasil que na Bahia já havia um grupo de jovens entusiastas que estavam fazendo cinema. E a tarefa foi concluída, felizmente, de modo compensador porquanto “Redenção” não fez feio e, certamente, não vai nos envergonhar fora daqui.

A EQUIPE

Apesar do espírito de equipe notada entre os componentes da Iglu e a modéstia observada em todos eles, por uma questão de inteira justiça somos obrigados a evidenciar o trabalho de três autênticos “gigantes”: Roberto Pires, Elio Moreno Lima e Oscar Santana. Estes rapazes, com o dinamismo e o entusiasmo característicos dos idealistas, lideraram o grupo até a vitória final. À eles toda a nossa admiração porque foram, indubitavelmente, os generais responsáveis pelo êxito desta árdua batalha que foi a realização de “Redenção”.

A equipe técnica está constituída da seguinte maneira: Elio Moreno Lima – produtor; Roberto C. Pires – diretor; Oscar Santana - coordenador; Alberto Barreto – assistente; Helio Silva – diretor de fotografia; Oscar Santana – cinegrafista; Rodi Luschesi – iluminador; Mario del Rio – montador; Alexandre Gnatalli – partiturista; Waldemar Brito – cenógrafo; Mário Magalhães – eletricista.

O elenco também formado de estreantes, conta com a participação de Geraldo D’el Rey, Braga Neto, Maria Caldas e Fred Júnior nos principais papéis e nos tipos secundários: Milton Gaúcho, Costa Júnior, Leonor de Barros, Raimundo Andrade, Jorge Cravo, Normand Moura, Klaus Klaus, Jackson Lemos, José Melo, Alberto Barreto, Orlando Rego e outros.

A PRODUÇÃO

Nada menos do que três milhões e duzentos mil cruzeiros foram gastos na produção da primeira película bahiana. Quantia esta levantada pela própria produtora, sem qualquer auxílio oficial ou empréstimo bancário. É claro que boa parte daquela importância foi aplicada na compra de maquinários necessários à filmagem, e que foi revertido ao patrimônio da Iglu, tornando assim mais baratas as futuras produções.

O processo utilizado denominado igluscope é uma variação do sistema anamórfico da cinemascope e foi idealizado pelo próprio diretor da fita Roberto Pires, que levou quase um ano pesquisando até conseguir fabricar a lente que planejara.

A Iglu não vai parar. Já tem um roteiro pronto para filmagem intitulado “Aconteceu na Bahia”, baseado em um conto de vigário verídico acontecido há anos nesta Capital. E está procurando novas histórias através de um concurso planejado pelo produtor Elio Moreno, que está oferecendo um prêmio de cinquenta mil cruzeiros para o melhor argumento.

O PÚBLICO PRECISA APOIAR

O público bahiano não pode ficar passivo diante dêste arrojado empreendimento. Necessário se torna prestigiar a obra dos jovens da Iglu, a fim de incentiva-los para que seja (sic) encetada novas produções cinematográficas. E êste apoio deve ser dado com a freqüência em massa aos cinemas que vão exibir “Redenção”. Vamos aplaudir os moços cineastas, eles bem merecem!

Mais informações
Cópias disponíveis: 16mm: Cinemateca Brasileira
35mm (Versão Restaurada): Cinemateca Brasileira
DVD (Versão Restaurada): Acervo Iglu Filmes, acervo DIMAS
Links: Cinemateca Brasileira: http://www.cinemateca.com.br/
Contato: petruspires@hotmail.com